14 de outubro de 2007

Um

Foram cinco anos acordando juntos. Antes disso, teve ano e meio de namoro com cada um sob seu teto. Eram dois tetos. Até que ele se mudou pro meu apartamento – no Sumaré, perto do metrô... – e virou um teto só.

Um mais um não eram dois e construímos uma vida formada daquelas duas meias pessoas que éramos até nosso encontro.

A intimidade era completa, as fantasias, compartilhadas e (muitas) realizadas. Era perfeito. Até quando a gente discordava havia uma concordância descomunal.

Mas um dia, começou o fim. Percebi isso quando cheguei em casa sonhando em encontrar silêncio, em não ver ninguém, em tirar o sapato, me jogar no sofá e poder não falar, não fazer, não ter a quem responder. Não precisar tomar banho nem ter obrigação de escolher o que a gente ia comer. Eu nunca tenho fome depois de dia tenso de trabalho. E ele não pode ficar sem comer. “Me desregula todo”, fala.

Depois de meses pensando cheguei à conclusão de que a gente devia parar por ali. A insistência acabaria de vez com aquele resto de respeito que sobrava. Foi isso que argumentei. A parte sobre querer ficar sozinha pra curtir silêncio, ficar mais comigo ou conhecer gente, não falei.

Ele ficou triste. Disse que valia a pena tentar mais um pouco, lembrou de viagens, de noites e dias em que trepamos loucamente, da festa surpresa que preparei quando ele entrou nos trinta. Enquanto falava, eu ficava pensando em como a gente se fez feliz. Ele até chorou.

Ontem fez um mês que voltaram a ser dois tetos. O meu é, de novo, só meu. Fico sem fazer nada quando quero e, se me der vontade, pego a bolsa e saio.

Fiz isso na quarta. Foi aniversário do Reinaldo, amigo do trabalho, num bar meio esotérico na Vila (o Reinaldo é todo místico). Foi ótimo, encontrei pessoas, conheci gente nova e lá pelas tantas paguei a conta e fui pegar o carro. Enquanto esperava o manobrista vi, um pouco à frente, um casal conhecido. Casal conhecido, não. Conhecido era o cara... Era ele! Há quase um mês não nos falávamos. Um mês...

Chegou primeiro o carro dele. O meu veio logo atrás. Olhei em volta e só achei um banco de madeira, dos manobristas. Primeiro, quebrei o farol pra em seguida dar com o banco no capô do carro, com toda a força que pude reunir. Bati uma, duas, três vezes e quando percebi a superfície amassada a contento, finalizei jogando o banco preto contra o vidro da frente. Não quebrou, mas fez um trinco de cima abaixo.

2 comentários:

Lucia Freitas disse...

Que história maravilhosa!!!
bj

Ricardo C. disse...

Delícia de narrativa, parece até que a gente está escutando uma conversa. E o final surpreendente? Tudo bem, a estória estava meio sambada, mas pegar o banco e fazer aquele estrago foi o máximo, hehehe!